Opressão, Violência e Vida

Corro o risco consciente de cair em vala comum dos discursos contra as formas de opressão que se multiplicam há décadas. Não desejo ser um ativista marxista de esquerda que gosta dos ambientes sociais turbulentos porque ganha com isso, inclusive financeiramente, mas tenho que concordar com muitas vozes atuais que o problema da violência coercitiva do poder de polícia e do Estado têm ultrapassado os limites convencionais de nossa amada liberdade.

O capitalismo desenfreado devora cada área da sociedade em sua fome por mais, sem se importar com o que causa na vida daqueles que não conseguiram lhe ser úteis por qualquer que tenha sido o motivo. Antes estávamos acostumados com as notícias de “opressão” vinda de países africanos, onde seus concidadãos guerreiam e mutilam aos seus próprios irmãos, de países fundamentalistas, onde os direitos das minorias e das mulheres são tolhidos, ou dos países totalitários, onde a liberdade em sua forma mais simples, como ver algo diferente na televisão ou viajar, não é permitido ao povo.

Hoje a opressão toma formas cada vez mais diversas. Como um vírus mutante, a cada época ela aumenta o seu campo de ação e suas vítimas, destruindo nossas resistências sociais, e o pior, utilizando de nosso próprio sistema contra nós, assim como uma síndrome virótica faz nas células humanas. Como a Quimera mitológica que causava destruição e horror entre os homens, não temos um Belerofonte heroico para nos salvar dela e os nossos antídotos e antibióticos sociais (as leis) parecem não fazer o efeito esperado.

De um lado lutamos contra as violências – violência doméstica, estupros, bullying escolar, abuso de autoridade no trabalho e assédios, desrespeito aos idosos, às crianças e aos portadores de deficiências, atos irresponsáveis de tirar outra vida por abortos, violência verbal e escrita, agressões e mortes por causa de futebol, violência criminal de todos os modelos e violência de gênero.

Por outro lado lidamos com a violência imposta pela opressão social – a truculência policial e seu claro despreparo para abordar e conter cidadãos em atos civis permitidos por lei, a abordagem deseducada dos agentes policias quando não estão sendo filmados, as desocupações e reintegrações de posse de terras (no campo) e de prédios (na cidade) para gente e organizações que não precisam deles senão para lucro e especulação, sem que as autoridades deem resposta concreta ao problema de moradia nos grandes centros urbanos e a visível massa de excluídos do sistema que perambulam pelas ruas e avenidas sem esperança de obter sua dignidade humana de volta.

É tão cansativo ver que as coisas não somente continuam as mesmas, mas que a cada ano que passa não melhora, por mais que políticas públicas paliativas sejam implantadas, que não resolvem o âmago do mal endêmico no tecido social e não criam condições para que, nem a violência/crime seja mitigada, e tampouco a dignidade dos direitos humanos mais básicos seja estabelecida, talvez porque não haja interesse dos mais abastados que isto não aconteça e não se tenha verdadeira vontade política para fazê-lo, pois o status quo dessa realidade beneficia a ambos: os abastados e os políticos corrompidos pelo poder. Lembro-me de nesta manhã ter lido um antigo provérbio:

Depois voltei-me, e atentei para todas as opressões que se fazem debaixo do sol; e eis que vi as lágrimas dos que foram oprimidos e dos que não têm consolador, e a força estava do lado dos seus opressores; mas eles não tinham consolador.[1]

Minha sincera oração é que Deus em sua infinita misericórdia levante na terra dos oprimidos consoladores do povo para que tragam paulatinamente de volta a dignidade humana e estabeleçam limites para que a violência e a opressão não se propaguem com facilidade patológica.

Carlos Carvalho
Graduando de Ciências Sociais pela Universidade Metodista de São Paulo
17 de abril de 2014



[1] Texto de Eclesiastes 4.1.

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